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terça-feira, 15 de outubro de 2019

Jovem varzeaporcense tem se tornado escritor referência em grandes revistas do país.



“Deve-se escrever da mesma maneira como as lavadeiras lá de Alagoas fazem seu ofício. Elas começam com uma primeira lavada, molham a roupa suja na beira da lagoa ou do riacho, torcem o pano, molham-no novamente, voltam a torcer. Colocam o anil, ensaboam e torcem uma, duas vezes. Depois enxáguam, dão mais uma molhada, agora jogando a água com a mão. Batem o pano na laje ou na pedra limpa, e dão mais uma torcida e mais outra, torcem até não pingar do pano uma só gota. Somente depois de feito tudo isso é que elas dependuram a roupa lavada na corda ou no varal, para secar. Pois quem se mete a escrever devia fazer a mesma coisa; a palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer”. (RAMOS, Graciliano).

Tal qual nos legou Graciliano Ramos, na citação acima, o ato da escrita não é tão tranquilo, exige de quem o deseja, um condicionamento diário, num esforço tamanho para que se alcance o prazer tão leve e esperado através do que se propõe a escrita. Neste sentido, batemos um papo com uma das referências, na nossa cidade, em Várzea do Poço.
O jovem Psicólogo e Cronista Maiky Oliveira, varzeaporcense, numa rápida entrevista, fez questão de nos apresentar como se deu e se dá o prazer pela escrita em sua trajetória, cujo início é desde muito cedo. Maiky já coleciona, em sua caminhada como jovem escritor, livros, crônicas e poemas, tudo de sua autoria. É importante dizer que, mesmo em tão pouco tempo, esse jovem varzeaporcense já tem uma trajetória muito exitosa, uma vez que, alguns dos seus escritos já foram e continuam sendo reconhecidos e aprovados em revistas de elevado reconhecimento no Brasil, como é o caso da Philos.
Nesta breve conversa, ele deixa escapar o desejo de que sua história, de algum modo, possa servir de exemplo para outras pessoas que perseguem o desejo pela escrita em nosso município.
Entrevistador: Como e qual momento você sentiu que a escrita era algo possível na sua vida?
Maiky Oliveira: Quando passei a ter contato com as obras de alguns escritores como Dostoiévski, Kafka, e outros escritores clássicos, me encantei de tal forma que desejava escrever algo tão magnífico como eles. No início foi bem difícil pois não achava nada do que eu escrevia bom. Mas, ainda assim, comprei a ideia de escrever um livro e estudei todas as etapas para produção de um. E depois de alguns meses conseguir escrever todas as minhas inquietações no que culminou no livro “O Desempregado”. Quando me convenci que realmente era capaz de escrever uma história, o resto do processo foi a parte mais fácil.
Entrevistador: Escrever é um oficio complexo?
Maiky Oliveira: Acredito que a depender do momento sim, pode ser complexo. Há momentos em que o processo de escrever é mais fácil, desenvolver um conto ou poema não se torna algo tão difícil. Já em outros momentos, escrever e pensar em cada ideia para seus escritos, é um sofrimento; é um momento em que você gasta muita energia para tentar criar algo. Acho que diversos eventos podem explicar isso, que vão do estado emocional ao que você se propõe em produzir.
Entrevistador: Por quais razões você considera a escrita importante?
Maiky Oliveira: Acho que escrever é uma forma de arte. E a arte aproxima as pessoas. Você consegue transmitir uma leitura de mundo única para os outros, ou seja, seus sentimentos, ideias e reflexões e acho que isso pode ser pedagógico para que tenhamos uma sociedade melhor. Para mim a escrita tem esse poder de mudar a forma que as pessoas se relacionam com o mundo.
Entrevistador: Existe um poema do Mario Quintana, em que em determinada estrofe ele assevera: “Quem faz um poema salva um afogado”. Você acredita que a escrita cumpre esse papel também? Embora o poema já seja em si um exercício de escrita?
Maiky Oliveira: Rubens Alves dizia que escrevia porque “estava sofrendo”. Talvez seja essa a perspectiva do poema do Mario. Acredito que a escrita seja uma forma de extravasar toda sua inquietação, e isso produz um alivio em que escrever, e talvez em quem leia também. Sem dúvidas a escrita cumpre esse papel, e creio que vá até além disto.
Entrevistador: É mais do que evidente o quanto sua trajetória tem sido de merecido reconhecimento, vide as aprovações de suas produções em grandes revistas de poemas e crônicas. Você imaginava que todo esse seu alcance fosse possível?
Maiky Oliveira: Não imagina que chegaria a tanto. Depois de escrever meu primeiro livro em que eu já achava muito improvável, consegui passar em concursos literários em várias regiões do país como Rio de Janeiro e São Paulo. Isso foi me motivando e agora estou sempre tentando algum concurso.
Entrevistador: O que você deixa de mensagem para as pessoas da cidade que tem esse mesmo desejo em relação a escrita, mas, não se vê tendo êxito, bem como você, neste âmbito?
Maiky Oliveira: Primeiro dizer que você é capaz de chegar longe. Muito longe. Há poemas, contos e crônicas que você vai escrever e não vai achar tão bom. Trabalhos seus que não serão selecionados em concurso. Mas isso não faz das suas obras um fracasso. Ser selecionado em um concurso ou alcançar uma parceria com uma editora famosa é só uma consequência. O mais importante é como você se sente bem escrevendo, este é o verdadeiro parâmetro de avaliação. É aprender amar a escrever. Por isso, escrevam e busque seus objetivos. Você conseguirá, mas, para isso, continue tentando.
Entrevistador: Por fim, queria que tu nos ofertasses um fragmento de um dos escritos que enxergas como relevante para sua caminhada como escritor, cronista, poeta.
Maiky Oliveira: Eu sempre busco trazer reflexões sociais em meus contos, e sempre de uma forma “exagerada”, justamente para chocar quem lê. Essa é uma característica minha. O conto abaixo se chama “Sinhá”. Foi selecionado para a edição especial de 50anos da Revista Philos. Uma edição em homenagem ao cantor e escritor Chico Buarque, no Rio de Janeiro.Os trabalhos teriam que ser inspirados na Obra de Chico. Me inspirei em uma das músicas do mesmo para escrever um conto que versa sobre o racismo e a desigualdade social:
“No fundo da casa em um pequeno quartinho, eu coloco meu colchão surrado e com mau cheiro. Ela me castiga às vezes. Deixa-me trancada no meu próprio quarto, no escuro, com fome, com medo. Ela diz que eu a invejo e com essa desculpa me violenta fisicamente, e de outras formas que não sei explicar. Minha sinhá é uma pessoa que tem raiva todos os dias. Uma raiva que nunca passa. Coitada da minha sinhá. Tão bela e tão diferente. Eu admiro sua pele clara e seus olhos azuis. Suas roupas caras e o legado de sua família influente na sociedade. Sinhá é única.
Minha sinhá não gosta da minha pele negra. Nem do meu cabelo, dos meus olhos, do meu comportamento, das minhas vestes, da minha religião, dos meus ancestrais, nem dos meus amigos, muito menos da minha família. Eu choro todos os dias ao servi minha sinhá, em seu condômino de luxo. Choro por seus filhos dos quais eu cuido. Às vezes eles me chamam de mãe, mas sinhá não gosta. Será que minha sinhá, cuidaria bem dos meus filhos? Eu choro. Mas as lágrimas são pela sinhá. Que nos melhores dias, tira minha liberdade e nos piores, sofre tanto quanto eu. Coitada da minha sinhá.
            Minhas colegas de bairro, também limpam, arrumam e cuidam dos filhos de outras sinhás. Cada uma tem sua sinhá. Algumas são educadas, e até pedem, por favor, são as melhores sinhás. Gostaria muito que meus filhos estudassem, com os filhos dessas sinhás. Mas isso não é possível e talvez nem seja bom, as sinhás são estranhas às vezes. Rezo para o mesmo Deus das sinhás, mas não vou à mesma igreja que elas. Eu juro por Deus, que tenho pena das sinhás, são diferentes.
            O mundo sempre foi cheio de várias sinhás. A maioria perversa, e outras, raras, mas bondosas. Se pelo menos as sinhás não fossem tão sinhá, as vezes, teríamos melhores sinhás nesse mundo. Que não desprezasse tanto, aqueles que não nasceram sinhá. Ser sinhá não é ser superior. É só falar bonito, ter filhos, e um pouco de dinheiro. Tente gente que não é sinhá e tem o dobro disto. Perdoe-me doce sinhá. Mas sinhá, os tempos mudaram e sinhá tem muito que aprender”.
     






Por Paulo Roberto dos Santos da Silva.










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